segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Capítulo dois - Na cidade.


O LAÇADOR - Espírito Gaúcho
Já é noite, e a humanidade deixa o corpo de Nelson Terêncio. Um grito de agonia precede o nascer de pêlos, o crescer de garras e por fim o urro das enormes mandíbulas da bocarra do monstro Lobisomem.
Os passageiros do trem estranham tais sons e vão até a cabine verificar o que está acontecendo quando vêem a porta voar com um forte coice, e depois se apavoram quando surge o imenso lobo negro na forma de homem.
Alguns tentam fugir mas é inútil. O monstro os ataca furioso com golpes mortais, dilacerando corpos, separando carne de ossos. Espalhando morte e sangue pelos vagões do trem. A carnificina prossegue até que reste apenas o maquinista, este resolve verificar qual o motivo dos gritos que vêm dos vagões do trem e deixa a locomotiva, colocando-a em piloto automático. Quando ele abre a porto se depara com o horror, corpos e sangue espalhados por todo o lugar.
- Deus do céu, o que aconteceu aqui?
A resposta vem na forma de um golpe que faz as garras do monstro trespassarem o ventre do maquinista das costas até a frente. Ele enxerga o punho da criatura romper sua barriga e desfalece. Ninguém restou vivo para fazer compania para o monstro, então ele vai saciar a sua fome.
O trem segue a sua viagem rumo a capital sem nenhum passageiro vivo além do Lobisomem. A locomotiva segue o rumo e numa descida aumenta a velocidade e não reduz mais. o trem passa direto por uma estação sem parar, deixando surpresos aqueles que o aguardavam ali para o embarque. As autoridades da estação tentam entrar em contato com alguem dentro do trem pelo rádio comunicador, mas não obtém resposta alguma. Eles então resolvem ir atrás do trem para averiguar o porque dele não ter parado na última estação. Mas nesta altura, o trem já está a poucos quilômetros de alcançar a capital, e um final para a viagem está próximo.
A velocidade do trem não diminui, e o destino está perto. Mas não há ninguém que possa guiar o trem, e a esta velocidade, uma trágica colisão com o fim da linha é iminente. O Lobisomem nem percebe e continua a sua refeição.
Neste instante começa a chover forte na capital, e o trem se aproxima do fim da linha onde os passageiros aguardam o embarque, mas novamente o trem passa direto em altíssima velocidade, apavorando a todos. Ele atravessa o sinal de fim da linha, rompe o final dos trilhos, raspando direto pelo chão de cascalho e brita, abrindo uma enorme vala até que o vagão frontal se detém, fazendo com que os vagões que se seguem vão se enfileirando, ficando uns sobre os outros numa incrível colisão. Quando atinge o último vagão onde está o Lobisomem o impacto arremessa a locomotiva longe, quando ele toca o solo, rola por vários metros. Dentro dele a criatura sacode debatendo-se como se fosse um boneco. Mais alguns segundos e o vagão pára, dentro o monstro permanece ainda por alguns instantes desacordado, e quando desperta, sai para fora do trem.
Do lado de fora o vagão parou bem diante do pedestal de uma estátua que é o símbolo desta cidade. O Laçador. A criatura fica paralizada defronte a estátua que brilha intensamente com o trovejar dos relâmpagos do céu, e da chuva que bate forte no imponente monumento.
O monstro não sabe porque, mas a visão da estátua do Laçador o faz estremecer e seu sangue gela. Parece que a estátua lhe encara, fitando-lhe os olhos num olhar sério, firmme, como se estivesse lhe recriminando ... não ... lhe prometendo. E isto faz o Lobisomem tremer de medo.
Um alvoroço vem ao longe anunciando a aproximação de curiosos ás dezenas. o monstro sai correndo dali, ainda sob o olhar da estátua em homenagem ao gaúcho.
Pessoas se aglomeram em torno do que restou dos vagões do trem, estupefatas por tamanha tragédia. A Polícia e os Bombeiros chegam rapidamente no local para fazerem seu serviço, e quando as chamas são debeladas eles entram dentro dos vagões. Eles se apavoram com a quantidade de corpos espalhados pelo chão do trem. Mas se assustam mais ainda ao perceberem que os ferimentos que causaram a morte dos passageiros não foram em decorrência do acidente do trem e da colisão, e sim foram feitos por garras de algum animal. Um enorme animal.
Uma investigação será feita e um boato já se espalha rapidamente pela população de que há uma terrível e abominável ciatura assassina na capital.
Não distante dali o Lobisomem corre para próximo de uma árvore bufando de cansaço. O monstro recosta-se para um breve descanço e percebe que o lumiar do sol desponta no horizonte anunciando o amanhecer. E os primeiros raios de sol que iluminam a terra lhe tocam o rosto iniciando a transformação da fera de volta ao homem. Os pêlos vão se retraindo, entrando de volta para dentro das mãos, e o rosto pontiagudo cheio de dentes afiados se desfaz mostrando a face humana de Nelson. Completamente exausto e suado, ele cai no chão e adormece, com os pingos da chuva lavando seu corpo repleto do sangue das suas vítimas.
Os primeiros raios de sol também vão se aproximando da estátua do Laçador e refletem no monumento de metal que esquenta e faz com que com que a água da chuva que escorria pela estátua evapore. O brilho so sol atinge tão fortemente o monumento que faz poe um momento o seu rosto desaparecer com o clarão. Neste instante a chuva pára. O dia já pode começar.
Nos jornais da cidade a tragédia do trem está estampada e ainda no local os jornalistas tentam obter mais informações sobre o ocorrido. A Polícia já isolou o local e milhares de curiosos se aglomeram para ver o que acontece ali. Das ferragens macas e mais macas tampadas com plásticos retiram um sem número de cadáveres. As horas se passam e a notícia é de que não há sobreviventes.
Perto dali, Nelson Terêncio desperta de um pesadelo e se vê nu atrás de uma árvore. Ele olha em volta e vê numa casa vizinha um varal com roupas que lhe podem servir. Ele pega então uma calça e uma camisa e as veste. Quando vai sair de volta para rua escuta um grasnado e percebe que o cão da casa se aproxima com os dentes à mostra. Mas Nelson olha firme nos olhos do animal e grunhe de volta , muito mais feroz que o cãozinho, que sai dali correndo com o rabo entre as pernas. Afinal, Nelson é um monstro pior do que qualquer cachorro.
Nelson sai nas ruas caminhando no meio das pessoas que seguem rumo ao trabalho. Muitos olham com desdém para ele, pois caminhando descalço, masi parece um mendigo. Ele percebe os olhares das pessoas e solta um grunhido que as apavora e as afasta. Ele segue caminhando e percebe que sua mão esquerda permanece sempre fechada, segurando algo. Ele abre a mão e percebe que segura um pingente com a foto de sua amada Linda, o motivo pelo qual ele veio para esta cidade.
Ele precisa encontrá-la e contar tudo o que aconteceu. Ela o ama, por isso certamente ela entenderá e o perdoará, pensa ele ... mas e se a noite chegar antes e a criatura despertar? Acontecerá mais mortes? Nelson tem que se apressar em localizar a sua noiva o mais depressa possível. Ele pensa: Há alguns meses atrás ele trouxe sua noiva aqui para a capital. Ela ficou na casa de sua tia, e é com certeza neste local que ela deve estar hospedada. Mas naquela oportunidade ele veio com o sogro, e não lembra que caminhos tomou para chegar até lá.
Sabe apenas que subiu várias lombas, e deve ser um local alto, talvez nos morros da cidade. Ele tenta entrar num ônibus, mas é repreendido pelo cobrador que o chama de mendigo e o manda descer. Nelson fica irado, mas percebe que se vestir mais adequadamente para transitar pela capital. Ele observa um senhor elegante vestido com um terno risca de giz, chapéu e botas. O homem caminha e Nelson o segue sem que ele se aperceba.
Quando o homem dobra uma viela e Nelson percebe que mais ninguém está próximo resolve atacar rapidamente o homem mordendo-lhe o pescoço, matando-o violentamente em poucos segundos. Nelson pega as roupas do homem e se veste com elas, agora bem vestido, caminha com igualdade entre os demais. Ele pede informações para um policial sobre qual ônibus deve pegar para ir até os morros da cidade, e o oficial indica-lhe o tal coletivo. Ele embarca, paga a passagem e senta na janela, acompanhando o trajeto. E se admira com a bela visão de Porto Alegre, com o Rio Guaíba ao fundo antes de dobrar para subir na direção aos morros.
Nelson pensa que, quando reencontrar a sua noiva, a trará para cá para passear pela orla à tarde, namorando ao pôr do sol. Como se nada tivesse acontecido.
... PROSSEGUE ...

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